sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Miau!

Colocou o gato no colo e ficou admirando aqueles olhos verdes do felino.
Enquanto coçava suavemente a barriga do bicho esquecia toda violência que praticara.
Não havia naquele ritual qualquer vestígio do homem de horas atrás.
Nem do gato de minutos atrás.
Não sabia por que, na sua existência miserável, havia se afeiçoado a um bicho inútil.
E não entendia o fato do bichano gostar do toque de suas mãos sempre tão grosseiras.
Aquela comunicação táctil era tão necessária quanto danosa para seu autoconhecimento.
Olhava para a porta da rua como se sentisse medo que alguém chegasse e o flagrasse em um momento tão vulnerável.
Certificando-se da ausência já esperada de pessoas, passou a deslizar o rosto pelo dorso macio do gato.
Iria deixá-lo.
Estava certo disso.
Era uma dolorosa despedida.
Na cadeia não permitem gatos.
Com quem deixaria o bichano?
O pobre animal iria virar um gato de rua. Sujo e mal alimentado.
Chorou ao vislumbrar este futuro sombrio para seu único amigo.
Ao menos um bom prato ele poderia oferecer naquela última noite.
Apanhou a tigela do chão sorrindo para os miados ansiosos aos seus pés.
Entrou no quarto e logo voltou com um belo pedaço de glúteo humano.

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