sexta-feira, 19 de abril de 2013

Quarentena

Não era tão difícil ficar preso com um arsenal tecnológico dentro de casa.
Acompanhar pela TV atentados terroristas e alta da inflação. 
Eram dias sem chegadas ou partidas e, por isso, sem boa parte dos cumprimentos que a boa convivência impõe.

Dormir. Uma das maiores ambições do cidadão moderno era, naquela casa, parte do lazer diário.
Mas o gosto era literalmente amargo ao acordar.

O clima dali cultivava além de vírus alguma coisa menor, mas de vida igualmente controversa.
As pulsões que realmente movem a vida estavam ali adormecidas, enquanto lá fora era pura brutalidade humana, sem causa e sem coerência. Ora se existe um organismo tão organizado que pode ser parasitado não seria o amor invulnerável à mácula que assola o mundo desde sempre. Tingindo e adulterando. Movendo as engrenagens dos rumos da história e atingindo a metáfora mais simples numa casa onde dois indivíduos vivem uma quarentena moderna. Silenciosamente. Como uma bomba que antes de explodir era uma inofensiva mochila. 
Seriam dias em que implosão e explosão seriam muito mais que antônimos. Seriam uma escolha, uma decisão. Um extermínio ou a criação de mais um segredo. Ou a própria morte do que se ensaiava naquele quarto em frente ao computador. Do que se ensaiava dizer. Do que se ensaiava revelar.

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